Tributação no Eixo Brasil-Portugal: pessoa física e pessoa jurídica
Importantes questões para considerar, pois há oportunidades reais de economia na tributação, para muitos casos.
Portugal se mantém no topo como um país estratégico, no centro geográfico entre as grandes economias mundiais, conhecido como a porta de entrada para a Europa e de fato, uma das mais acessíveis para os brasileiros, tanto pelos aspectos culturais e o idioma, quanto pelo menor custo de vida.
Suas projeções econômicas seguem entre as mais estáveis e promissoras, se comparadas aos países membros da União Europeia. O Banco de Portugal aponta para um crescimento de 1,8% em 2023, mais que o dobro no comparativo com os demais países e as previsões da Comissão Europeia colocam Portugal a crescer acima da média da Zona do Euro até 2024. Seu clima ameno e agradável ao longo de todo o ano, somado com um dos principais indicadores: o título de um dos países mais seguros do mundo, segundo o Global Peace Index. São todos bons motivos e fortes argumentos para a tomada de decisão de escolher Portugal como o local para se viver, mudar com a sua família e internacionalizar a sua empresa.
No entanto, uma das questões mais importantes a se considerar nesta mudança de país, tanto quanto alinhar os objetivos em comum com a família e da empresa da qual se é sócio ou executivo, são os aspectos da tributação, com oportunidades reais de economia fiscal em muitos casos. Seja no âmbito da pessoa física – ou pessoa singular, como o termo é utilizado em Portugal – seja na pessoa jurídica ou coletiva, tais vantagens não são desprezíveis, e devem ser bem compreendidas no processo de mudança e de internacionalização.
Vale salientar que é necessário uma análise mais detalhada da realidade de cada pessoa e de cada empresa, pois as recomendações podem depender de vários aspectos, como por exemplo o regime jurídico-fiscal da empresa da qual a pessoa que altera sua residência é sócia. De toda forma, destacamos três importantes situações sobre a Tributação no Eixo Brasil-Portugal.
BITRIBUTAÇÃO
Não é raro nos depararmos com várias pessoas que fizeram a mudança de país, mas não comunicaram à Receita Federal do Brasil a sua alteração de residência fiscal ou sua saída definitiva do país.
Essa pessoa continuará, via de regra, obrigada a declarar e recolher imposto de renda no Brasil sobre a totalidade das suas receitas, e tal situação poderá acarretar a chamada bitributação, pois tanto no Brasil quanto em Portugal prevalece o critério da residência para fins fiscais, segundo o qual a totalidade das receitas recebidas pelo contribuinte, inclusive no exterior, estará sujeita à tributação.
Trata-se de consequência do princípio da universalidade da tributação para fins de imposto de renda, adotado tanto pela República Federativa do Brasil quanto pela República Portuguesa. Quando falamos em evitar a bitributação, isso significa não tributar o mesmo fator gerador duas vezes, ainda que por países distintos. Em ordem a se evitar esse fenômeno, tão prejudicial às relações no âmbito internacional e ao investimento estrangeiro, Brasil e Portugal firmaram acordo para evitar a dupla tributação e a prevenir a evasão fiscal em matéria de impostos sobre o rendimento. Isso não exclui a necessidade, no entanto, de o contribuinte indicar o seu país de residência, como forma de maximizar os benefícios do acordo e evitar a dupla oneração dos seus rendimentos.
É possível usufruir das benesses deste acordo em sintonia com as leis fiscais de ambos os países. Minimamente, realizar um planejamento tributário internacional antes de arrumar as malas, pensar antecipadamente o impacto tributário em ambos os países e os possíveis benefícios, podem evitar grandes desconfortos.
Residente Não Habitual (RNH)
Outro benefício interessante é atentar para a possibilidade do regime fiscal do Residente Não Habitual (RNH). É um programa fiscal que oferece uma série de vantagens para quem se muda para Portugal, especialmente aqueles que têm rendimentos elevados ou pensionistas. De forma resumida, algumas das principais vantagens incluem:
1- Isenção fiscal de rendimentos obtidos no estrangeiro: os residentes não habituais em Portugal podem ser isentos de impostos sobre determinados rendimentos obtidos fora de Portugal.
2- Taxas reduzidas para rendimentos obtidos em Portugal: os residentes não habituais beneficiam de uma taxa fixa especial de imposto de renda pessoal de 20% sobre determinados rendimentos obtidos em Portugal, relacionados com atividades de alto valor acrescentado ou considerados de interesse para a economia portuguesa.
3- Alíquota reduzida sobre pensão: os pensionistas que se mudam para Portugal podem beneficiar de uma alíquota reduzida de 10% do imposto sobre a pensão que recebem do exterior, sem prejuízo da aplicação do tratado para evitar dupla tributação.
Para destacar um exemplo prático: com o pedido deste benefício realizado dentro do período correto, determinadas rendas vindas do Brasil não serão tributadas em Portugal durante 10 anos. Suponhamos que se trata de um empresário que mantém sua empresa no Brasil, com seus sócios. E esta sociedade distribui a ele, dividendos. Hoje na legislação brasileira esses dividendos não são tributados, são isentos. E como ele mora em Portugal, com o regime do Residente Não Habitual (RNH), essa pessoa pode receber esses dividendos em Portugal também isentos. Então ele não será tributado no Brasil e também não será tributado em Portugal.
Isso comparado ao regime jurídico-fiscal normal é um benefício muito vantajoso. Em Portugal a alíquota progressiva do Imposto de Renda (Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares (IRS)) varia de 14,5% até 48%, para os recebimentos acima de 80.882 Euros anuais, ainda somam-se os adicionais de solidariedade. No ponto de vista da distribuição de dividendos, Portugal iria tributar esses recursos em 28%, acaso não cobertos pelo regime do RNH.
Esse regime fiscal é acessível à pessoa que não residiu em Portugal nos 5 anos antecedentes, mudou-se para o país e fez o pedido no prazo certo.
No entanto, é importante lembrar que as vantagens do RNH podem variar de acordo com a situação individual de cada residente não habitual, pelo que é importante obter aconselhamento fiscal especializado antes de tomar qualquer decisão.
Isenção do IVA
No ponto de vista da empresa. De maneira estratégica, caso tenha clientes estabelecidos no Brasil, o IVA, o imposto em Portugal, atrelado a esta prestação de serviço poderá ser isento. O IVA (Imposto sobre o Valor Acrescentado) é pago pelo consumidor, solicitante do serviço no momento em que adquire o bem ou serviço prestado. O vendedor ou prestador de serviços recebe o valor do IVA e, posteriormente, entrega-o à Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) portuguesa. A isenção do IVA em Portugal se aplica a prestações de serviços realizadas em território português, mas cujo destinatário seja uma pessoa ou empresa estabelecida fora da União Europeia, como é o caso do Brasil.
Para que a isenção seja aplicada, é necessário que os seguintes requisitos sejam cumpridos:
1- O serviço deve ser prestado a um cliente que esteja fora da União Europeia, como o Brasil.
2- O serviço deve ser utilizado fora da União Europeia, como no caso do Brasil.
3- O prestador de serviço deve estar estabelecido em Portugal e estar registado para efeitos de IVA em Portugal.
4- O prestador de serviço deve emitir uma fatura com a menção específica acerca da isenção.
É importante ressaltar que esta isenção não se aplica a todos os tipos de serviços. Existem algumas exceções, como os serviços relacionados com bens imóveis, transporte de pessoas, serviços financeiros, entre outros.
Por fim, devemos alertar que o não cumprimento dos requisitos para a aplicação da isenção pode levar a uma situação de incumprimento fiscal, com consequências mais sérias para o prestador de serviços. Portanto, é importante que o empresário obtenha orientação profissional antes de realizar operações comerciais deste tipo, a fim de garantir o cumprimento adequado das obrigações fiscais e evitar possíveis sanções por parte da Autoridade Tributária (AT).
Outro ponto essencial a se considerar. Como os dois países têm uma série de normas e especificidades, é sempre importante receber as orientações de quem vivencia cada um dos mercados, ou seja o especialista tributário no Brasil e o especialista tributário no mercado português. É imprescindível ter as duas visões, Brasil e Portugal, para uma análise mais precisa e uma otimização da carga tributária-fiscal.
Há oportunidades reais de economia na tributação, vale compreender a correta e melhor aplicação da legislação para o seu caso.
Autores:
Fernando Dizero Senise é Advogado no Brasil e em Portugal. Formado em Direito no Brasil em 2002, com licenciatura reconhecida na Universidade de Lisboa, tem também pós-graduações em Direito Ambiental e Público. Possui LLM em Direito dos Contratos pelo Insper com extensão na Universitat Saint Gallen – Suíça, além de MBA Executivo também no Insper com extensão internacional em empreendedorismo pela Babson College nos USA. Tem vasta experiência no atendimento de empresas e empresários, especialmente nas áreas imigratória, contratual, imobiliária, fiscal e internacional de forma geral. É sócio do Escritório Brasil Salomão e responsável pela condução das atividades do Escritório em Portugal.
Gabriel Magalhães Borges Prata é advogado tributarista, sócio do escritório Brasil Salomão e Matthes Advocacia, LLM em Direito Tributário pela Queen Mary, Universidade de Londres, mestre em Direito Tributário pela PUC/SP e professor conferencista do IBET – Instituto Brasileiro de Estudos Tributários.
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